domingo, 27 de novembro de 2011

VIVA

Vá, bonita, e deixe a vida entrar pela janela,
Abra os  olhos,   veja enfim que é primavera.
Deixe  o sol remover o mofo das paredes
E da alma mergulhada em lassidão.

Ande , bela, e desça à rua, que é vibrante,
Que é tão cheia de automóveis e pessoas,
Fale, brinque e se embriague da alegria alumiada,
Da euforia e das bebidas que há no bar.

Vá viver uma paixão tão tresloucada
De fazer se arrepiar qualquer cristão.
Vá, bonita, e sinta a alma tão intensa
Como o fogo que faz alguém sambar.

2011

terça-feira, 22 de novembro de 2011

COISA BONITA

Coisa bonita é mulher,
 Mulher se despindo ou vestindo,
 Soltando os cabelos ao vento,
 Jogando os seus olhos lânguidos
 Nos olhos de um felizardo.

Bonito é mulher andando,
 Fazendo dançar as ancas,
 Fazendo vibrar as nádegas,
 A encher de desejo os homens.

Bonito é mulhr sorrindo:
 Manhã, primavera súbita,
 História de amor eterno
 Ornada de orvalho e sol,
 Paixão sem medida ou siso.

Bonito é mulher falando:
 Desejo de a ter nos braços,
 Beijá-la por todo o corpo,
 Despi-la à luz de penumbra
 Da lua adentrando o quarto.

Bonito é mulher amando:
 A mim não ocorrem palavras
 Pra dar a medida exata
 E o nome das coisas que sinto,
 Que só quem traduz é o corpo
 E a  alma, jamais o  verbo.

2011

CANTA DE ALEGRIA

Canta de alegria, menina, não pranteies
 Os desenganos e tristezas que encontraste
 Na procura tão insana por aquilo
 Que, ao buscar,  comumente não se  encontra
 Mas que acaso pode vir de graça às tuas  mãos
 E - mas que ironia! - até pode  te cansar.

Canta de alegria por teu viço e teu carisma,
 Que tranbsbordam de viveza as ruas onde passas.
 Canta e saboreia a juventude, que reserva
 Um sem-fim de tempo, de esperanças e de acasos
 E surpresas e, em momentos mais inesperados,
 As mais várias razões de amar a vida.

2011

terça-feira, 15 de novembro de 2011

DIAS

Vivo a vida quase à toa:
Sou na sexta humorístico,
Sou no sábado analítico,
No domingo, parasítico,
Nas segunda, sou tão crítico,
Terça-feira sou raquítico,
Quarta-feira, quase místico,
Na quinta já não aguento mais:
Vou ali me matar e não volto.

Em momentos tão inúteis
Eu me deito inutilmente
E vejo um inútil programa
De uma emissora de inutilidade ainda maior.
Vou ali me matar e não volto.
Vou ali me matar e não volto.

2011

domingo, 13 de novembro de 2011

O SENTIMENTO DENTRO DE MIM

O sentimento que tenho em mim
É tão sereno como os acordes
Das melodias enamoradas
Das noites calmas e enluaradas.

O sentimento que canta em mim
Parece pluma, saudade leve,
É sinfonia de querubins,
É  acalanto, relva,  jardins.

O sentimento que pulsa em mim
Tem a quentura de um aguardente,
Pura tequila, conhaque, gim,
É labareda, lábios carmim.

O sentimento que grita em mim
É queda d'água, é turbilhão,
Mar em ressaca, chuva sem fim,
Banda com turba, tambor, clarim
O sentimento que canta em mim,
Um sol candente dentro de mim.

2011

(Por favor, é BANDA COM TURBA [= MULTIDÃO EM EBULIÇÃO] mesmo, não TUBA [=INSTRUMENTO DE SOPRO])

A VOLTA POR CIMA OU A GLÓRIA POSSÍVEL

Não era nenhum poço de virtudes,
Mas se desmanchou de amores por ele,
Que  até nas pobres cobras conseguia dar rasteira ,
Que fazia que o maior dos maiores vigaristas,
Parecesse um santo ou um seminarista.

Ela era sedutora, era lasciva,
Mas só dava seu corpo ao felizardo
Que lhe tocasse  a libido fortemente
Ou gerasse uma pecúnia ou vantagem parecida.
Já o escroque se mantinha das amantes,
Que era um grupo de mulheres vário e muito vasto:
Mocinhas, matronas, menores e balzaquianas,
Maduras, idosas e as não muito genuínas,
Tudo lhe sendo motivo pra se dar a traições.

Quando a moça se sabia traída ou desprezada,
Desabava a sentir-se a  derradeira das mulheres
E se via morta em vida, se arrastava pela vida,
Se danava nos seus prantos e cervejas vagabundas
E pedia a todo santo que o tornasse um ser fiel.

Quando o homem lhe ligava madrugada,
Ela punha porta afora o amante eventual
E se dava ao seu "herói tão principesco"
Numa imensa e singular sofreguidão.

Ela tinha o nome dele num papel sob a calcinha,
Murumurava o nome dele nas noitinhas de silêncio
E acordava lhe avistando o rosto na memória,
E a miragem lhe era fonte de alegria e amor à vida.

Mas um dia alguém mandou o seu amado
Prestar contas dos pecados lá no mundo de São Pedro,
E ela então se viu tão louca e desolada,
Tão sem rumo e horizonte, tão sozinha e tão sem chão.

Hoje é membro muito assíduo numa igreja barulhenta
E casou com um sujeito mais velho trinta anos,
Pobre, troncho, fraco, moralista, autoritário,
E dedica-se ao mendigos e à palavra do Senhor.

2011

NO TERREIRO

"Minha santa, traz de volta aquele moço,
Mas traz ele suplicante, tão pedinte,
Tão mendigo, que eu me apraza
Em limpar nele meus pés."

"Meu amigo, dá um jeito no meu chefe,
Faz que ele me olhe e não me veja,
Perca o cargo, o posto, o emprego,
Mas que eu tenha paz de vez por todas."

"Diz, meu santo, que presentes
Você quer pr'eu ter sucesso,
Pra fazer muito dinheiro,
Pra ter pompa e posição."

"Diz, mãezinha, como faço
Pra roubar João de Rita,
Pra que Zé nunca me deixe,
Pra trazer Durval pra mim."

"Diz, meu pai, qual o remédio
Pra que eu tenha uma parceira
Que me ame e aceite chifres,
Que me lave e calce os pés."

"Diz, menino, que mandinga
Pôr no mato pra que todos
Que me vejam me idolatrem
E abram portas para mim."

"O que eu pago pra que Tânia
A mim fique sempre atada
E que o peste do marido
Já nos saia do caminho?"

"Tira, pai, deste meu corpo
O "trabalho" tão danado
Que pessoa tão malvada
Fez pro fim do meu sossego."

"Não lhe peço, vó, pra ter fortuna,
Quero paz e ter saúde,
Mas não sei que flores, frutas
Eu arrio no jardim."

2011

SENTIMENTO ESTRANHO

Sentimento estranho
o sentimento seu,
que se alimenta da distância,
do abandono, indiferença
e do desprezo meu.

Sentimento mais bizarro,
que goza sob as dores da tortura
e que sorri nos dissabores,
que encontra na aflição imensa
a sua fonte de energia,
que se nutre do que mata,
se sustenta de veneno..

Sentimento mais insano,
que, correspondido, empalidece,
protra-se, definha
e desfalece como mortalmente:
mas que, repudiado, acende,
cresce, aviva-se e floresce
em manhãs de primavera.
Sentimento estranho
o sentimento seu.

2011